PEC do novo Fundeb é aprovada em dois turnos na Câmara e segue para o Senado

Publicado em 22 de Julho de 2020 às 18h23. Atualizado em 22 de Julho de 2020 às 18h26

Votação impôs derrota ao governo que queria desviar recursos da educação para programa de assistência social e ainda criar voucher para destinar verbas públicas para educação privada

A mobilização de diversos setores da sociedade impôs uma importante derrota ao governo Bolsonaro, com a aprovação em dois turnos nessa terça (21), na Câmara dos Deputados, da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 15/2015. O texto, que torna permanente o Fundo de Desenvolvimento e Valorização dos Profissionais de Educação (Fundeb) e eleva a participação da União no financiamento da educação infantil e dos ensinos fundamental e médio, segue agora para votação no Senado. 

Embora não tenha alcançado os patamares de financiamento desejados e traga pontos complicados, como a possibilidade de parceria com entidades sem fins lucrativos, a votação foi considerada uma vitória, em tempos de tantos ataques à educação pública.

“A aprovação da PEC impôs uma grande derrota ao governo, que tentou inclusive apresentar a proposta de que o novo Fundeb só passasse a valer a partir de 2022. E, embora ainda não tenhamos conquistado o percentual desejado de recursos para a educação básica, avaliamos como vitória, uma vez que a PEC inclui o Fundo na Constituição de forma permanente, e não mais com prazo de validade, como o atual, que vence em dezembro”, avalia Eblin Farage, secretária-geral do ANDES-SN.

Após não conseguir emplacar sua proposta nem desmobilizar a casa, o governo tentou apresentar destaques ao relatório da deputada Dorinha (DEM/TO), mas não obteve sucesso. As tentativas de retirar o piso de 70% do Fundeb para pagamento dos salários dos trabalhadores da educação, apresentada em destaque pelo partido Novo, e também de deixar fora do texto o custo aluno/qualidade (CAQi/CAQ) foram derrubadas. O texto-base da PEC 15/2015 foi aprovado em segundo turno por 492 votos a 6, além de 1 abstenção. No primeiro turno, realizado também na terça (21), o placar da votação foi de 499 votos a 7.

Confira alguns dos pontos da PEC votada pelos deputados e pelas deputadas:

Aumento gradativo dos recursos
De acordo com o texto aprovado, a contribuição da União para o Fundeb crescerá de forma gradativa de 2021 a 2026, para substituir o modelo cuja vigência acaba em dezembro.
Nos próximos seis anos, a parcela da União deverá passar dos atuais 10% para 23% do total do Fundeb, por meio de acréscimos anuais. Assim, em 2021 começará com 12%; passando para 15% em 2022; 17% em 2023; 19% em 2024; 21% em 2025; e 23% em 2026.

Os valores colocados pelo governo federal continuarão a ser distribuídos para os entes federativos que não alcançarem o valor anual mínimo aplicado por aluno na educação. Da mesma forma, o fundo continuará recebendo o equivalente a 20% dos impostos municipais e estaduais e das transferências constitucionais de parte dos tributos federais.

Em 2019, o Fundeb distribuiu R$ 156,3 bilhões para a rede pública. Atualmente, o fundo garante dois terços dos recursos que os municípios investem em educação. Os repasses da União, que representam 10% do fundo, não entram no teto de gastos, impostos pela Emenda Constitucional 95. 

Por não estar regulado pela EC 95, o governo queria desviar recursos do Fundeb para outras finalidades, como um programa de assistência social, área atingida pelos cortes do Teto dos Gastos. “Ao invés de propor a revogação dessa Emenda criminosa, o governo queria usar recursos da educação pública, que já não são suficientes, para outra finalidade, reforçando seu caráter de inimigo da educação pública”, criticou Eblin.

Desigualdades regionais
Dos 13% a mais que a União irá destinar ao Fundeb, até 2026, 10,5% deverão complementar cada rede de ensino municipal, distrital ou estadual sempre que o valor anual total por aluno (VAAT) não atingir o mínimo definido nacionalmente. A intenção é diminuir desigualdades regionais no recebimento do apoio.

Após acordo com o governo, pelo menos metade do dinheiro (5%) deverá ser destinada à educação infantil. A PEC prevê inclusive a destinação desse recurso, se for o caso, para escolas comunitárias, confessionais ou filantrópicas, um ponto problemático, pois já há vários exemplos nos estados de desvios de recursos públicos através de repasses de verbas para organizações sociais fazerem a gestão de escolas públicas.

Uma legislação futura deverá regulamentar vários detalhes sobre o Fundeb, inclusive o cálculo do VAAT, para o qual a PEC já define parâmetros. Outra regra determina que, no mínimo, 70% dos recursos extras deverão pagar salários dos profissionais da educação ‒ hoje, esse piso é de 60% e só beneficia professores ‒, e pelo menos 15% terão que custear investimentos nas escolas.

Ainda em relação aos professores, uma lei específica definirá o piso salarial nacional para a educação básica pública. A partir da vigência da futura emenda constitucional, fica explícito que o dinheiro do Fundeb não poderá ser usado para pagar aposentadorias e pensões, como queria o governo federal.

Gestão e qualidade
Os outros 2,5% que a União deverá colocar a mais no Fundeb serão distribuídos às redes públicas que cumprirem requisitos de melhoria na gestão previstos em lei e atingirem indicadores de aprendizagem com redução das desigualdades, nos termos do sistema nacional de avaliação da educação básica.
Entretanto, conforme o texto aprovado, essa parte do repasse extra da União começará a valer apenas em 2023 (no equivalente a 0,75 ponto), será ampliada ano a ano e atingirá a integralidade dos 2,5 pontos a partir de 2026.

Os entes federativos deverão usar os recursos do Fundeb exclusivamente em sua atuação prioritária definida na Constituição: os municípios cuidam da educação infantil e do ensino fundamental; e os estados, do ensino fundamental e médio. Assim, o dinheiro não poderá ser aplicado, por exemplo, em universidades.
Para cumprirem o montante mínimo de 25% dos impostos investidos anualmente em educação, também conforme a Constituição, estados e municípios poderão contar somente com 30% do total repassado pela União. Nenhum ente federativo poderá reter os repasses vinculados ao Fundeb, sob pena de crime de responsabilidade.

Regulamentação
A lei que regulamentará o novo Fundeb deverá levar em conta as metas do plano nacional de educação; o valor anual por aluno investido em cada etapa e modalidade; a transparência e o controle social dos fundos; e o conteúdo e a periodicidade da avaliação dos indicadores de qualidade.
Esse regulamento definirá ponderações relativas ao nível socioeconômico dos estudantes e à disponibilidade de recursos vinculados à educação e o potencial de arrecadação de cada ente federativo.

Quanto ao padrão mínimo de qualidade do ensino, a referência será o custo aluno qualidade, constante no Plano Nacional de Educação (Lei 13.005/14), com o objetivo de encontrar o financiamento necessário por estudante para a melhoria da qualidade da educação no Brasil.

Dados centralizados
O texto que segue para aprovação no Senado determina a centralização dos dados contábeis, orçamentários e fiscais da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios. O objetivo é garantir a rastreabilidade e a comparação dos dados para divulgá-los ao público.

No caso de uma reforma tributária, o texto prevê que deve ser garantida, em cada exercício financeiro, a aplicação dos montantes mínimos em educação por estados, municípios e União equivalentes à média aritmética dos últimos três anos, independentemente da extinção ou substituição de tributos.
Uma lei deverá regulamentar a fiscalização, a avaliação e o controle das despesas com educação nas esferas estadual, distrital e municipal.

A partir da publicação da futura emenda constitucional, os estados terão dois anos para vincular parte dos repasses do ICMS para os municípios a indicadores de melhoria nos resultados de aprendizagem e de aumento da equidade.

Atualmente, os estados repassam parte do ICMS arrecadado (25%) às cidades. A PEC diminui o total repassado proporcionalmente às operações realizadas no território de cada município e aumenta o mesmo tanto no repasse que nova lei estadual deverá vincular às melhorias na educação.

*Com informações da Agência Câmara de Notícias

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