A Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) lançou, no final do mês de junho, o Regime de Exercícios Domiciliares Especiais (Rede). De acordo com a instituição, o método tem como objetivo facilitar o ensino enquanto as atividades presenciais na universidade não retornarem. Apresentada como uma plataforma de ensino, a ferramenta foi lançada oficialmente alguns dias após o Ministério da Educação (MEC) estender a autorização para aulas virtuais na rede federal até 31 de dezembro de 2020. A UFSM é uma das 10 universidades que adotaram atividades de ensino remoto, de um total de 69 universidades federais em todo o país.
Desde março, a UFSM suspendeu as atividades acadêmicas e administrativas presenciais, devido à pandemia da Covid-19. Neste mesmo mês, a universidade apresentou o Rede como um mecanismo que manteria, em tese, os vínculos entre docentes e estudantes. Três meses depois, a plataforma vem gerando muitas dúvidas na categoria docente, que relata inclusive situações de pressão e assédio para aderir à docência em ensino remoto diante de um cenário de medo em decorrência da Covid-19.
Segundo Maristela de Souza, secretária-geral da Seção Sindical dos Docentes da UFSM (Sedufsm SSind. - Seção Sindical do ANDES-SN), o Rede foi implantado sem diálogo com a comunidade acadêmica e de forma vertical pela UFSM, através de instruções normativas. "A Sedufsm SSind. defende que o calendário letivo da graduação, no que se refere ao ensino, seja suspenso. O Rede não pode ser chamado de plataforma, mas de uma metodologia idealizada para conduzir o semestre letivo no ensino", disse a diretora.
Para a secretária-geral da Sedufsm SSind., a universidade deveria resistir a qualquer pressão do governo federal que venha propor algo que desqualifique as instituições públicas de ensino. "A universidade tem a sua autonomia garantida constitucionalmente e, além disso, tem um tripé de ensino, pesquisa e extensão em que ela se propõe a ter qualidade e relevância social", ressaltou.
Dificuldades
Uma pesquisa feita pela própria UFSM apontou alguns dos desafios enfrentados pelos docentes que aderiram ao Rede: 54,3% deles relataram que estão encontrando dificuldades no trabalho remoto, 51,8% na transposição dos conteúdos do presencial para o virtual e 47,6% afirmaram ter uma conexão de internet de má qualidade. A pesquisa mostrou também que a principal dificuldade dos estudantes que acessam a plataforma, e daqueles que não estão acessando a plataforma, é a internet de má qualidade: 76,2% e 72,2%, respectivamente, seguido de falta de equipamentos adequados: 64,7% e 60,8%.
"Na própria universidade, neste momento, há uma desigualdade social. Quem está mandando os trabalhos, aderindo às redes, atendendo essa metodologia? São os alunos que têm condição social para isso. Os alunos que não têm condições materiais e financeiras não estão conseguindo aderir. Muitos alunos tiveram que voltar para cidades do interior para tentar encontrar trabalho e ajudar os pais, que perderam os empregos por conta da pandemia. Os professores também estão sofrendo com essa realidade, principalmente os que não conseguiram se apropriar e movimentar as ferramentas digitais", reforçou a secretaria geral da Sedufsm SSind.
Diálogo
Segundo Maristela Souza, a Sedufsm SSind. tem tentado um diálogo com a reitoria desde o início da fase de implementação do Rede mas apenas uma reunião foi realizada, no início da pandemia. Depois disso, a entidade não foi mais atendida. A diretora contou que a reitoria se recusa a discutir o calendário letivo com a seção sindical do ANDES-SN.
Diante das inúmeras negativas, os docentes se reuniram no dia 7 de julho, em assembleia virtual, para aprofundar o debate sobre o ensino remoto e apontar encaminhamentos sobre o Rede. Na ocasião, foi deliberado que uma comissão - formada por professores e representantes dos segmentos dos técnicos e estudantes - irá elaborar um documento sobre o Rede que será enviado, após aprovação em nova assembleia docente, à Administração Central da UFSM.
"Defendemos o não início do segundo semestre antes de encerrado o primeiro, e que o primeiro só seja encerrado no retorno às aulas presenciais, com a garantia das 15 semanas de aulas para que ocorra a recuperação e a resolução dos problemas gerados pelo ensino remoto no primeiro semestre de 2020. Entre eles, a situação dos professores que não aderiram ao ensino remoto; é preciso que eles tenham a garantia dessas 15 semanas para desenvolverem as suas aulas. E, também, para aqueles professores que aderiram ao ensino remoto e os alunos não o fizeram, é preciso que seja reservado um período de tempo para que se desenvolva a recuperação do ensino, garantindo a qualidade e relevância social do conhecimento da UFSM", conclui Maristela de Souza.