Desde essa quarta-feira (28), Paulo Roberto da Silva Lima, o Paulo Galo do movimento Entregadores Antifascistas, e sua companheira Géssica Barbosa estão presos, acusados de participarem da ação que ateou fogo a uma estátua do bandeirante Borba Gato, responsável por escravizar, torturar, estuprar e assassinar pessoas negras e indígenas.
O casal foi, voluntariamente, à 11ª Delegacia de Polícia para prestar esclarecimentos sobre o caso, quando recebeu voz de prisão. A juíza substituta Gabriela Marques da Silva Bertoli é quem assina os mandados para que o casal fosse preso. Além disso, a magistrada autorizou também a busca e apreensão e quebra do sigilo telemático de ambos.
O pedido de prisão feito pela Polícia Civil alega “associação criminosa”, definida no artigo 288 do Código Penal como “associarem-se 3 (três) ou mais pessoas, para o fim específico de cometer crimes”. O mesmo artigo já foi utilizado para criminalizar outros protestos, como os ocorridos na greve geral de 2019 e na tentativa de enquadrar os “18 do CCSP” - 18 jovens presos no Centro Cultural São Paulo, em setembro de 2016, antes de uma manifestação contra o então presidente Michel Temer (MDB).
Paulo Galo é integrante do movimento Revolução Periférica, que reivindicou autoria do incêndio da estátua no sábado (24), no bairro de Santo Amaro, zona sul da capital paulista. Ele assumiu ser um dos autores do protesto. Géssica Barbosa, no entanto, não estava no ato no final de semana, tem emprego fixo e uma criança de 3 anos, o que torna sua detenção, além de abusiva, ilegal.
“Para mim é absolutamente surreal”, diz Jacob Filho, advogado do casal, em entrevista à Ponte Jornalismo. “Você pega políticos que foram presos mas a mulher não, porque tem um filho menor. Mas quando se trata de uma mulher negra, periférica, aí sim. A Géssica tem uma criança de três anos. Você tem uma decisão da Suprema Corte que veda esse tipo de prisão, mas ela está mantida”, completa defensor.
Um habeas corpus coletivo da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), de fevereiro de 2018, determina que mães com filhos de até 12 anos, que tenham prisão cautelar decretada, cumpram prisão domiciliar.
Além da detenção injustificada de Géssica, a defesa de Galo argumenta que “prisão temporária para quem se apresenta é um absurdo”. O entregador compareceu ao 11ªDP para apresentar sua versão dos fatos e suas justificativas e ainda autorizou a busca em sua residência, uma vez que o mandado expedido estava com o endereço errado.
Ainda de acordo com a Ponte Jornalismo, o delegado do 11º DP, Pietrantonio Minichillo de Araújo, disse que o ataque à estátua foi “um fato muito grave pela dimensão que tomou aquele incêndio”, e que Galo e Géssica “permanecerão recolhidos pelo prazo de cinco dias. Vamos fazer as investigações, e se for preciso, pelo prazo de mais cinco dias a partir de um pedido de prorrogação”. Ainda segundo informações da 11ª DP, caso seja confirmado que Géssica não participou do ato, sua prisão será revogada.
Solidariedade
O ANDES-SN se soma a diversas outras entidades sindicais e movimentos sociais na solidariedade a Paulo Galo e Gessica Barbosa e na cobrança pela imediata liberação de ambos. Em nota, a diretoria do Sindicato Nacional ressalta que “trata-se de mais uma medida do Estado capitalista para criminalizar o(a)s lutadores (as) sociais e punir quem está na luta em defesa da vida e dos interesses do(a)s trabalhadores (as) e das causas populares”.
Para a diretoria do ANDES-SN, o movimento de ação direta, desenvolvido pelo coletivo Revolução Periférica, incendiando a estátua do Borba Gato, caracterizou-se como “uma ação democrática de resistência e legítimo direito de rebelião diante da sacralização de um personagem que ajudou a dizimar os povos originários, quilombolas e que abusou das mulheres dessas populações”. Confira aqui a nota.
Homenagem indevida
A ação do movimento Revolução Periférica foi tomada para questionar a validade da homenagem. “Para aqueles que dizem que a gente precisa ir por meios democráticos, o objetivo do ato foi abrir o debate. Agora, as pessoas decidem se elas querem uma estátua de 13 metros de altura de um genocida e abusador de mulheres”, afirmou Galo ao chegar à delegacia.
Borba Gato foi um bandeirante paulista, nascido em 1649. Começou suas expedições com seu sogro, Fernão Dias Paes. Era um escravocrata, que possui em sua história várias menções a torturas e estupros de pessoas negras e indígenas. Uma das bases de suas atividades econômicas era justamente a caça de indígenas para escravizá-los, prática que acabou por dizimar vários povos.
A ação direta contra a estátua aconteceu no sábado (24), mesmo dia em que ocorreram atos pelo Fora Bolsonaro e Mourão em todo o país. Militantes colocaram pneus próximos ao monumento e atearam fogo. Policiais militares e bombeiros chegaram ao local pouco tempo depois, controlaram as chamas e liberaram o tráfego. Ninguém ficou ferido. E o fogo não comprometeu a estrutura da estátua.
*Com informações da Rede Brasil Atual e Ponte Jornalismo