“O Crusp tem sede, caminhão pipa já”. A palavra de ordem, vista nos dizeres de um cartaz improvisado, sintetiza um dos dramas vividos por estudantes que moram no Conjunto Residencial da Universidade de São Paulo (USP), na Cidade Universitária do Butantã, e que motivaram o protesto realizado na manhã de terça-feira (2), um dos maiores ocorridos nos últimos meses. Além de fechar o portão do principal do campus da capital, os e as estudantes promoveram um vigoroso ato diante da Reitoria.
As dificuldades no abastecimento de água no Crusp são apenas um dos diversos problemas enfrentados por quem depende de assistência da universidade. Para as e os estudantes, as políticas de permanência estudantil definidas pela Reitoria são insuficientes e estão muito aquém das necessidades, dificultando, especialmente, a continuidade dos estudos de discentes que ingressam nos cursos de graduação da USP pelo sistema de cotas.
A mobilização de terça foi aprovada em assembleias e convocada pelo Diretório Central dos Estudantes (DCE-Livre), por diversos centros acadêmicos e pela Associação de Pós-Graduandxs (APG-Capital). No ato, foi lida a “Carta de Reivindicações do Comitê por uma Reforma Democrática do Crusp”, que traça um diagnóstico da situação atual da permanência estudantil e pede medidas contra as deficiências apontadas. Além das entidades representativas do corpo discente, o comitê inclui a Associação dos Moradores do Crusp (Amorcrusp).
“Fim da falta d’água” é a primeira reivindicação registrada na carta. “O problema da falta d'água no Crusp é recorrente. Durante a pandemia, por exemplo, mesmo com a moradia esvaziada, foram inúmeros episódios em que os moradores ficaram sem água em suas casas. Assim, além de soluções emergenciais a curto prazo, exigimos a garantia do fim do problema, o que deve incluir a construção de um sistema de reservatórios que sejam suficientes para garantir o amortecimento das quedas de abastecimento”, afirma o documento.
A carta alude ainda à prática da Sabesp de redução da pressão da água, apontada pela própria Pró-Reitoria de Inclusão e Pertencimento (PRIP) como uma das principais causas da irregularidade no abastecimento de água do Crusp. Nesse caso, dizem os signatários, “é responsabilidade da Reitoria garantir o direito à água para todos os moradores, executando as reformas necessárias para tornar a rede de distribuição hidráulica capaz de manter o fornecimento adequado”.
Outra reivindicação das entidades é a de que a Reitoria se comprometa com a participação dos moradores e das moradoras na reforma em curso no Crusp. “Garantia documental de que a reforma de todos os blocos ocorrerá, e que ocorrerá com a participação dos moradores em todos os blocos, por meio de vias acordadas com os moradores. Ou seja, que as demandas construídas em Comitê, composto por moradores e suas entidades, e comunicadas pela Comissão de representantes em contato com a PRIP, ou qualquer outra instância que venha a assumir a pasta, sejam reconhecidas e legitimadas”, reivindicam.
Além disso, propõem que as iniciativas da Reitoria, no âmbito da reforma, sejam “previamente comunicadas e decididas em conjunto com os moradores, que serão informados pela Comissão e tomarão suas decisões em assembleia”. O documento reforça essa reivindicação, ao assinalar que “qualquer processo democrático de reforma só será possível mediante o compromisso documental da Reitoria, por meio da PRIP, em garantir que todos os blocos do Conjunto Residencial da USP serão reformados e destinados à moradia estudantil, inclusive os blocos K e L”, e demanda ainda que “o próximo bloco alvo de reforma seja o bloco L, a fim de corrigir a redução de vagas provocada pelo esvaziamento do bloco D”.
Após destacar que o fim da falta de água e a participação na reforma já em andamento “são as mais urgentes e necessárias reivindicações”, a carta lembra que a situação do Crusp e da permanência estudantil envolve outras demandas, “que por hora não receberão igual destaque, em vistas de nossa prioridade expressada”.
Mas, como “outras demandas não negligenciáveis e necessárias de serem resolvidas imediatamente por parte da PRIP e da Reitoria”, a carta aponta as seguintes medidas: “reparo imediato de todos os elevadores do Crusp, muitos dos quais seguem há meses sem funcionar; aumento da frota de ônibus circulares nos fins de semana para atender os moradores do Crusp e nos horários de pico dos dias úteis; diminuição das filas dos restaurantes universitários, e a fiscalização do cumprimento dos contratos; fornecimento de janta aos fins de semana para atender a demanda do Crusp; retorno do passe livre no transporte público para moradores do Crusp; políticas mais efetivas na promoção de saúde mental para os moradores”.
As entidades reivindicam igualmente duas importantes providências de natureza financeira: aumento do valor do auxílio-moradia e das bolsas do Programa de Estímulo ao Ensino de Graduação (PEEG) e do Programa Unificado de Bolsas (PUB) para R$ 1 mil mensais, e implementação de um auxílio para estudantes que habitam as moradias estudantis.
Uma comissão de manifestantes — formada por três representantes do DCE-Livre e um da Amorcrusp — foi recebida, durante a manifestação diante da Reitoria, por um grupo ad hoc de representantes da administração, constituído pela pró-reitora Ana Lúcia Duarte Lanna (PRIP), pela prefeita do campus, Raquel Rolnik, e por representantes da Superintendência do Espaço Físico (SEF) e do Gabinete do Reitor.
Os discentes entregaram a gestores da USP dois documentos: a carta lida no ato e o Manifesto por Permanência Estudantil na USP. A principal questão abordada pelas partes foi a do abastecimento de água no Crusp. “O que a gente conquistou nos últimos tempos é que a Reitoria está estruturando a construção de mais reservatórios de água para os blocos F e G do Crusp, que mais sofrem com a falta de água, a perspectiva é dobrar a capacidade atual de armazenamento de água, de 20 mil para 40 mil litros. A gente pediu uma perspectiva de prazo, eles deram prazo de um mês para terminar isso”, relatou ao Informativo Adusp o representante do DCE-Livre, Daniel Lustosa Gomes de Sá Barreto.
Diante do prazo fixado, foram exigidas medidas imediatas contra a falta de água no decorrer desse período. A comissão da Reitoria informou que já entrou em contato com o presidente da Sabesp em busca de soluções para o problema.
Estudantes da FAU entram em greve
Nessa quarta-feira (21), estudantes da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU-USP) entraram em greve, em protesto contra a decisão da Reitoria de não contemplar o curso de Design no projeto de contratação de 876 docentes efetivos para a universidade até o ano de 2023.
Durante a paralisação geral dos estudantes da Cidade Universitária do Butantã na terça (20), estudantes da FAU reuniram-se em assembleia com mais de 100 participantes e aprovaram a greve. “Não somente há falta de professores, como há risco de se fechar o curso de Design”, adverte o DCE-Livre em seu perfil no Instagram.
Uma plenária das três categorias - estudantes, docentes e técnico-administrativos/as - foi convocada pelo Grêmio Estudantil da FAU (gfaud) para esta quinta (22), no final da tarde, no Piso do Museu. “Com objetivo de ampliar o debate acerca da situação crítica vivida pelos estudantes do curso de Design, que se encontram sem o oferecimento de optativas dada a falta de professores, bem como o histórico sucateamento do curso pela faculdade, o gfaud convoca os estudantes, professores e funcionários para discutir a situação e construir propostas que prezem pela resolução e melhoria das questões atualmente enfrentadas”, afirma o grêmio estudantil.
Nova assembleia estudantil está convocada para dia 30, depois da reunião da Congregação da FAU prevista para este mês. “O curso do Design vem sofrendo com o descaso e a ineficiência dos agentes públicos na sua gestão”, afirma o gfaud.
Nos últimos anos, a Adusp Seção Sindical do ANDES-SN vem, sistematicamente, apontando a alarmante redução do número total de docentes efetivo(a)s da USP. Em abril deste ano, noticiou que o déficit de docentes chegou a exatos 1.000, em comparação ao quadro existente em 2014. As 876 contratações previstas provavelmente vão cobrir apenas as perdas com aposentadorias, falecimentos e exonerações até 2025, sem permitir que se retome o patamar anterior.
Fonte: Adusp SSind. com edição do ANDES-SN. Fotos: Daniel Garcia / Adusp SSind.